segunda-feira, janeiro 31, 2005

Chávez exorciza o imperialismo dos EUA e elogia Lula

FLÁVIA MARREIRO
ANA FLOR

Em dois discursos que somados chegaram quase a três horas, o presidente venezuelano Hugo Chávez criticou à exaustão o presidente George Bush, exorcizou o "imperialismo diabólico" norte-americano e fez elogios ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Chávez começou o dia com uma visita ao assentamento do MST Lagoa do Junco, no município de Tapes (RS), a 130 km de Porto Alegre, e encerrou sua participação pública no 5º Fórum Social Mundial, com discurso no ginásio de esportes Gigantinho.O ginásio ficou lotado e cerca de 2.000 pessoas ficaram do lado de fora, acompanhando por um telão. O calor e a duração do discurso fez com que muitas pessoas deixassem o ginásio ao longo da fala de Chávez. A estimativa é de que o público total tenha chegado a 12 mil pessoas -semelhante ao que assistiu a Lula, quinta-feira, no mesmo local.
O presidente da Venezuela -um dos países que sediará o Fórum Social Mundial em 2006- abusou de piadas, histórias e, em muitos momentos, subiu o tom de voz, chegando quase a gritar. "Para romper com o imperialismo só há o caminho da revolução", disse, arrancando palmas da platéia. Além de críticas aos EUA, Chávez jogou números para falar do "sucesso" dos programas sociais de seu país.
Ao final, falou de Lula e pediu paciência aos brasileiros: "Na Venezuela, em especial nos primeiros dois anos de governo, as pessoas cobravam mudanças, queriam mais rápido, mais radical. Considero que não era o momento, porque há fases nos processos, há ritmos que não têm a ver só com a situação interna do país, mas com a situação internacional. "Gosto de Lula, o aprecio. É um bom homem, de grande coração, lhe dou meu afeto, meu abraço."
Antes do elogio, Chávez chegou a brincar com a possibilidade de ser vaiado ao falar do colega brasileiro. Isso porque, no início do evento, o ministro Olívio Dutra (Cidades) foi vaiado ao falar de Lula. O presidente da CUT, Luiz Marinho, foi vaiado por quase cinco minutos.
O clima no ginásio era de total admiração a Chávez, que foi chamado por Ignácio Ramonet, diretor do "Le Monde Diplomatique", de "novo libertador". A vinda do presidente venezuelano havia sido divulgada pela cidade com cartazes semelhantes aos de shows.
O presidente trouxe ao Brasil uma comitiva de pelo menos 15 pessoas e um aparato de marketing, com livros para distribuir e uma equipe técnica que transmitiu ao vivo o discurso no Gigantinho e fez gravações em Tapes.
As metáforas anti-EUA, de uso freqüente pelo presidente, povoaram todo o discurso de Chávez, que atacou desde o presidente americano Thomas Jefferson (1746-1826) até Bush e sua secretária de Estado, Condoleezza Rice -com quem brincou, chamando-a de "Condolência Rice".
"Os EUA nasceram imperialistas [...] Faz muito tempo que a mão peluda, ossuda e fedorenta do imperialismo americano vem atropelando nossas terras", disse ele pela manhã, em Tapes. Chávez usou o encontro para divulgar sua "revolução agrária" na Venezuela, polêmico programa de desapropriação de terras chamado de "guerra contra o latifúndio".

Estratégia de poder
"Creio que é tempo de ofensiva", disse Chávez para defender que o fórum prepare, nos próximos anos, "uma estratégia de poder". "Os próximos cinco anos de Fórum Social Mundial devem ser acompanhados de uma agenda social mundial. A ela deve-se agregar uma estratégia de poder. [...] Poder para transferi-lo ao povo", completou, citando a Venezuela como "modesto exemplo".
Enquanto elogiava o histórico do evento, interrompeu a fala para perguntar o nome e a idade de um menino à frente do palco. "Cinco anos? A mesma idade do fórum. É um filho do fórum, um "forito'" -um dos momentos em que Chávez trocou o tom messiânico por habilidade que fazia lembrar os programas de auditório.
Pela manhã, foi interrompido pela parte venezuelana da platéia, que entoava: "Alerta! Alerta! Alerta que caminha/ A espada de Bolívar na América Latina". À noite, o público também o interrompi.
Simon Bolívar foi citado durante todo o dia, não sem referências ao companheiro brasileiro do líder da independência no Equador, Bolívia e Venezuela, pernambucano José Inácio Abreu Silva.

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