quarta-feira, dezembro 18, 2013

Is This The Real Thing?


This is just a simulation
This is just a simulation

You are just an illustration
This is just a simulation
Lines and pixels on a piece of paper

You are just an illustration
This is just a simulation
Lines and pixels on a piece of paper

You are just an illustration
This is just a simulation
Lines and pixels on a piece of paper
Lines and pixels on a piece of paper

You are just an illustration
You will live forever

This is just a simulation
Is this the real thing? (Repeat to fade)

quinta-feira, outubro 03, 2013

Contra a sedução


Não se deixe seduzir! 
Não há caminho de volta. 
O dia se aproxima 
E já se sente o frio da noite. 
A manhã não virá nunca mais.

Não se deixe enganar! 
A vida não é muita coisa. 
É preciso bebê-la em grandes goles! 
Vocês não terão bebido o bastante 
Quando chegar a hora de deixá-la.

Não se deixem envolver! 
Não terão tempo bastante! 
Deixem apodrecer os cadáveres. 
A vida leva-os sempre 
E não se vive senão uma vez.

Não se deixem arrastar 
Aos trabalhos e às galeras. 
De que, então, vocês têm medo? 
Como todos os animais, vocês morrerão 
E depois da morte não há mais nada.

Bertolt Brecht (1898-1956). Contra a sedução.

terça-feira, maio 28, 2013

Pessimista inquieto?! Sim, obrigado.


Para combater o totalitarismo, basta compreender uma única coisa: o totalitarismo é a negação mais radical da liberdade. No entanto, a negação da liberdade é comum a todas as tiranias e não é de importância fundamental para compreender a natureza peculiar do totalitarismo. Contudo, quem não se mobiliza quando a liberdade está sob ameaça jamais se mobilizará por coisa alguma. Mesmo as admoestações morais, os protestos contra crimes sem precedentes na história, e não previstos nos Dez Mandamentos, serão de pouca valia. A própria existência de movimentos totalitários no mundo não totalitário, isto é, o apelo que o totalitarismo exerce sobre as pessoas que dispõem de todas as informações e que são alertadas diariamente contra ele, dá provas eloquentes da falência de toda a estrutura da moralidade, de todo o corpo de mandamentos e proibições que tradicionalmente traduziam e encarnavam as ideias fundamentais de liberdade e justiça em termos de relações sociais e instituições políticas. 
Mesmo assim, muitos duvidam que essa falência seja real. Essas pessoas costumam achar que aconteceu algum acidente e que agora o dever é restaurar a ordem antiga, apelar ao antigo conhecimento do certo e do errado, mobilizar os velhos instintos de ordem e segurança. Rotulam quem fala e pensa de outra maneira de "profeta da catástrofe", cuja sombra ameaça toldar o sol que se levanta sobre o bem e o mal por toda a eternidade. 
O cerne da questão é que os "profetas da catástrofe", os pessimistas históricos do final do século XIX e começo do século XX, de Burckhardt a Splengler, foram ultrapassados pela concretude de catástrofes de dimensões e horrores jamais previstos. No entanto, alguns desdobramentos poderiam ser e foram previstos. Embora pouco se tenham feito ouvir no século XIX, essas previsões se encontram no século XVIII, e foram negligenciadas porque nada poderia justificá-las. Vale a pena saber, por exemplo, o que Kant tinha a dizer, em 1793, sobre o "equilíbrio de poder" como solução para os conflitos do sistema do Estado nacional europeu: "O chamado equilíbrio dos poderes na Europa é como a casa de Swift, que foi construída numa harmonia tão perfeita com todas as leis do equilíbrio que, quando um pássaro pousou sobre ela, ruiu imediatamente − um simples fantasma". O equilíbrio alcançado pelo sistema de Estados nacionais não foi um mero fantasma, mas ruiu exatamente conforme as previsões de Kant.
Hannah Arendt (1906-1975). Sobre a natureza do totalitarismo: uma tentativa de compreensão.

terça-feira, maio 07, 2013

Autobiografia de Bertrand Russell


Prólogo


Três paixões, simples, mas irresistivelmente fortes, governaram-me a vida: o anseio de amor, a busca do conhecimento e a dolorosa piedade pelo sofrimento da humanidade. Tais paixões, como grandes vendavais, impeliram-me para aqui e acolá, em curso instável, por sobre profundo oceano de angústia, chegando às raias do desespero.

Busquei, primeiro, o amor, porque ele produz êxtase - um êxtase tão grande que, não raro, eu sacrificava todo o resto da minha vida por umas poucas horas dessa alegria. Ambicionava-o, ainda, porque o amor nos liberta da solidão - essa solidão terrível através da qual a nossa trêmule percepção observa, além dos limites do mundo, esse abismo frio e exânime. Busquei-o, finalmente, porque vi na união do amor, numa miniatura mística, algo que prefigurava a visão que os santos e os poetas imaginavam. Eis o que busquei e, embora isso possa parecer demasiado bom para a vida humana, foi isso que - afinal - encontrei.

Com paixão igual, busquei o conhecimento. Eu queria compreender o coração dos homens. Gostaria de saber porque cintilam as estrelas. E procurei apreender a força pitagórica pela qual o número permanece acima do fluxo dos acontecimentos. Um pouco disto, mas não muito, eu o consegui.

Amor e conhecimento, até ao ponto em que são possíveis, conduzem para o alto, rumo ao céu. Mas a piedade sempre me trazia de volta à terra. Ecos de gritos de dor ecoavam em meu coração. Crianças famintas, vítimas torturadas por opressores, velhos desvalidos a constituir um fardo para seus filhos, e todo o mundo de solidão, pobreza e sofrimentos, convertem numa irrisão o que deveria ser a vida humana. Anseio por aliviar o mal, mas não posso, e também sofro.

Eis o que tem sido a minha vida. Tenho-a considerado digna de ser vivida e, de bom grado, tornaria a vivê-la, se me fosse dada tal oportunidade.

Bertrand Russell (1872-1970)

quarta-feira, janeiro 23, 2013

Wissenschaf: ein Glaube (?)


Na ciência as convicções não têm nenhum direito de cidadania, assim se diz com bom fundamento: somente quando elas se resolvem a rebaixar-se à modéstia de uma hipótese, de um ponto de vista provisório de ensaio, de uma ficção regulativa, pode ser-lhes concedida a entrada e até mesmo um certo valor dentro do reino do conhecimento — sempre com a restrição de permanecerem sob vigilância policial, sob a polícia da desconfiança. — Mas isso, visto com mais precisão, não quer dizer: somente quando a convicção deixa de ser convicção, ela pode ter acesso à ciência? A disciplina do espírito científico não começa com o não mais se permitir convicções?... Assim é, provavelmente: só resta perguntar se, para essa disciplina poder começar, já não tem de haver uma convicção,e aliás tão imperiosa e incondicional, que sacrifica a si mesma todas as outras convicções? Vê-se que também a ciência repousa sobre uma crença, não há nenhuma ciência ‘sem pressupostos’. A questão, se é preciso verdade, não só já tem de estar de antemão respondida afirmativamente, mas afirmada em tal grau que nela alcança a expressão esta proposição, esta crença, esta convicção: ‘Nada é mais necessário do que a verdade, e em proporção a ela todo o resto só tem um valor de segunda ordem’. — Essa incondicionada vontade de verdade: o que é ela? É a vontade de não se deixar enganar? É a vontade de não enganar? Pois também desta última maneira poderia ser interpretada a vontade de verdade: pressuposto que sob a generalização ‘eu não quero enganar’ esteja incluído também o caso particular ‘eu não quero me enganar’. Mas por que não enganar? Mas por que não se deixar enganar? — Note-se que os fundamentos do primeiro caso ficam em um domínio totalmente outro do que os do segundo caso: não se quer deixar-se enganar, sob a hipótese de que é pernicioso, perigoso, fatal ser enganado — nesse sentido, ciência seria uma longa prudência, uma cautela, uma utilidade, contra a qual, porém, se poderia, com justiça, objetar: como? o não-querer-se-deixar-enganar é efetivamente menos pernicioso, menos perigoso, menos fatal? O que sabeis de antemão do caráter da existência, para poder decidir se a maior vantagem está do lado do desconfiado incondicional ou do confiante incondicional? Mas, caso ambas forem necessárias, muita confiança e muita desconfiança: de onde então poderia tirar a ciência sua crença incondicionada, e sua convicção, que repousa sobre ela, de que verdade é mais importante do que qualquer outra coisa, do que qualquer outra convicção? Justamente essa convicção não poderia ter surgido, se verdade e inverdade se mostrassem ambas constantemente como úteis: como é o caso. Portanto — a crença na ciência, que agora está aí incontestavelmente, não pode ter tirado sua origem de um tal cálculo utilitário, mas, antes, a despeito de lhe ter sido constantemente demonstrada a inutilidade e periculosidade da ‘vontade de verdade’, da ‘verdade a todo preço’. ‘A todo preço’: oh, nós o entendemos bastante bem, depois que oferecemos e trucidamos uma crença depois da outra sobre esse altar! — Conseqüentemente, ‘vontade de verdade’ não quer dizer ‘eu não quero me deixar enganar’, mas sim — não há nenhuma escolha — ‘eu não quero enganar, nem sequer a mim mesmo’: e com isso estamos no terreno da moral. Pois basta perguntar-se fundamentalmente: ‘Por que não queres enganar?’, especialmente se houvesse a aparência — e há essa aparência — de que a vida depende de aparência, quero dizer, de erro, impostura, disfarce, cegamento, autocegamento, e se, por outro lado, a grande forma da vida sempre se tivesse mostrado, de fato, do lado dos mais inescrupulosos polytropoi. Um tal propósito poderia, talvez, interpretado brandamente, ser um quixotismo, um pequeno desatino entusiasta; mas poderia também ser algo ainda pior, ou seja, um princípio destrutivo, hostil à vida... ‘Vontade de verdade’ — isso poderia ser uma velada vontade de morte. — Dessa forma a questão: por que ciência? reconduz ao problema moral: para que em geral moral, se vida, natureza, história, são ‘imorais’? Sem dúvida nenhuma, o verídico, naquele sentido temerário e último, como o pressupõe a crença na ciência, afirma com isso um outro mundo do que o da vida, da natureza e da história; e, na medida em que afirma esse ‘outro mundo’, como? não precisa, justamente com isso, de... negar seu reverso, este mundo, o nosso mundo?... No entanto, já se terá compreendido aonde quero chegar, ou seja, que é sempre ainda sobre uma crença metafísica que repousa nossa crença na ciência — que também nós, conhecedores de hoje, nós os sem-Deus e os antimetafísicos, também nosso fogo, nós o tiramos ainda da fogueira que uma crença milenar acendeu, aquela crença cristã, que era também a crença de Platão, de que Deus é a verdade, de que a verdade é divina... Mas, e se precisamente isso se tornar cada vez mais desacreditado, se nada mais se demonstrar como divino, que não seja o erro, a cegueira, a mentira — se Deus mesmo se demonstrar como nossa mais longa mentira?
Friedrich Nietzsche (1844-1900), A Gaia Ciência, § 344.